Queda de investimentos do governo federal encolhe ensino superior no Brasil

por André Candreva publicado 27/03/2018 09h23, última modificação 27/03/2018 09h23

Fonte: Hoje Em Dia

 

Após passar por um período de expansão do número de vagas e de investimentos no ensino superior e na pesquisa científica e tecnológica, o Brasil enfrenta um período de estagnação e encolhimento na educação. 

 

No ensino superior, as matrículas, que pularam de 5,1 milhões, em 2009, para cerca de 8 milhões, em 2015, seguem sem avanço. O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que chegou a ter 663,3 mil contratos em 2014, registrou 203,5 mil em 2016.

 

Na área de ciência e tecnologia, na última semana, o governo federal cortou 44% do orçamento de 2017. O montante equivale a R$ 2,2 bilhões, o que faz com que o recurso disponível corresponda a 1/4 do de 2013.

 

“A cobertura de ensino superior, que abrange em torno de 18% dos jovens de 20 a 24 anos, já é muito baixa em relação ao resto do mundo, onde a taxa varia de 40% a 60%. Havia o desafio de expandir muito mais, como previsto no Plano Nacional de Educação (projeção de 33% da cobertura para 2024). Com o corte de recursos, a situação se torna mais grave”, afirma o professor Lúcio Mendes Faria, do Projeto “Pensar a Educação, Pensar o Brasil”, da UFMG. 

 

Impactos

 

No setor de pesquisa, os cortes têm impacto direto em trabalhos que podem resolver problemas na vida das pessoas. 

 

Marianna Kunrath, doutoranda em bioquímica pela UFMG, aponta falta de reagentes químicos no laboratório, bolsa estagnada em R$ 2.200 desde 2013, e até a ausência de recursos para a publicação dos resultados da pesquisa em revistas especializadas. 

 

Experiência

 

Desenvolvendo um estudo sobre células-tronco e células tumorais, Marianna não conseguirá passar um período da pesquisa em uma universidade fora do Brasil – o chamado “doutorado sanduíche”. 

 

Muitos programas de pós-graduação do país estão dividindo as bolsas de 12 meses de sanduíche, que seriam para um aluno, por três, para não suspender a ida de pesquisadores.

 

Também no campo da saúde, Adriana Bozzi iniciou um trabalho sobre a doença de chagas em 2015 como pesquisadora visitante na Universidade Stanford, nos EUA, mas não teve o financiamento renovado pelo governo.

 

“Fui para lá aprender uma nova tecnologia. Só pude continuar porque os pesquisadores da universidade bancaram a finalização do projeto”. 

 

Falta de verbas para ciência é prejudicial à economia do país

 

Outra polêmica envolvendo o ensino superior e a área de pesquisa foi a alteração do controverso programa “Ciência Sem Fronteiras”, anunciado no começo da semana pelo Ministério da Educação (MEC). 

 

Criado com o objetivo de enviar estudantes de graduação para o exterior, com a meta de 100 mil alunos, a iniciativa foi transformada em 5 mil bolsas para pós-graduação (mestrado, doutorado e pós-doutorado), afirma o MEC.

 

Para Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira do Progresso da Ciência, os cortes são uma “tragédia anunciada”, e têm relação direta com a aprovada PEC do Teto dos Gastos e à fusão do Ministério da Ciência e Tecnologia com o das Comunicações, ambas em 2016. 

 

“De tudo que o governo gasta, só 0,34% vai para Ciência e Inovação. As pessoas não têm ideia do que pode acontecer! A ciência é hoje a responsável por o país não ter quebrado financeiramente. Foi a ciência brasileira que descobriu o Pré-Sal, que aumentou a produtividade da carne e da soja, que vinham contribuindo para manter a economia dos trilhos”, argumenta.

 

MEC responsabiliza gestão anterior por problemas

 

Sobre as metas de jovens no ensino superior, previstas no Plano Nacional de Educação (PNE), o MEC afirma que a atual gestão “recebeu o ministério com o descumprimento de todas as metas para 2016 e praticamente todas as estratégias contidas no plano mal encaminhadas. Para as metas de 2024, ainda é cedo para falar em descumprimento, mas o MEC trabalha na melhoria da gestão dos programas para alcançar melhores resultados”.

 

afirma que não procede a informação de que a fusão feita em 2016 reduziu a capacidade de investimento da pasta, “o que se comprova inclusive pelo aumento de recursos previstos para o novo ministério, quando em comparação com o ano anterior à fusão – R$ 4,8 bilhões em 2016 e R$ 6 bilhões em 2017”.

 

Conforme o Ministério, “ainda está em análise o impacto do contingenciamento determinado pelo Ministério do Planejamento para este ano”.